Auto da bênção e da inauguração do estabelecimento balnear dos Cucos
As Termas dos Cucos, situadas a cerca de dois quilómetros a sueste da cidade de Torres Vedras, terão sido utilizadas, de acordo com os registos escritos existentes, pelo menos desde 1746 para curar males como “sarnas, lepras, caquechias, inchaçoens, e de curar chagas sordidas, gotas arteticas, convulçoens, parllezias, e obestruçoens de olhos, servindo algumas vezes de remedio paleatico às chagas cancrozas, e podera servir para remedio de outras muitas queixas”.
Cientes da diversidade mineralógica e da pureza das águas do Vale dos Cucos, desde o século XVIII que os diversos proprietários foram construindo barracas de madeira e casas de habitação térreas para fazer face à crescente afluência dos doentes. Mas foi José Gonçalves Dias Neiva quem mandou construir o Estabelecimento Balnear dos Cucos, cujo projeto endereçou, em 1891, “À excelentíssima Câmara Municipal de Torres Vedras como demonstração dos seus ardentes votos pela prosperidade do concelho”.
O projeto inicial era bastante ambicioso e dispendioso e, apesar das obras se terem prolongado entre 1890 e 1896, não foi totalmente cumprido, uma vez que apenas se construiu o balneário, a Praça dos Cucos, a Avenida das Termas, o Casino e duas das quarenta moradias projetadas. Em 1892 o casino e os dois challets ainda não estavam construídos, mas o estabelecimento termal abriu provisoriamente, sendo inaugurado oficialmente há 130 anos, a 15 de maio de 1893.
O Auto de bençam e da inauguração do Estabelecimento balnear dos Cucos foi lavrado em duplicado, tendo um dos documentos ficado na posse do proprietário e o outro no Arquivo da Câmara Municipal. Pela descrição lavrada no Auto sabe-se que o dia 15 de maio de 1893 começou cedo, às 5 horas da manhã, quando José Gonçalves Dias Neiva, acompanhado pelo reverendo prior da freguesia Padre Manuel Alexandre, o engenheiro do estabelecimento António Jorge Freire, o mestre da obra João José Alves, o gerente Augusto Lafaia de Castro e o pessoal menor da exploração compareceram para a bênção do edifício segundo o ritual romano, começando pelo reservatório das nascentes termais, caldeira e maquinismos e terminando na Sala da Copa, onde a bandeira do estabelecimento também foi benzida.
Após a bênção, às 8 da manhã juntaram-se para as cerimónias de inauguração o diretor médico Dr. Justino Xavier da Silva Freire e os amigos particulares do proprietário que, recebidos por foguetes, foram “até à sala da Copa, onde está collocada na parede do lado direito uma lapide commemorativa, offereceu-lhe o engenheiro [ao proprietário] a ponta da colcha que a occultava, a qual elle tomou e, puchando-a, descobrio a dita lapide”.
A cerimónia terminou após o içar da bandeira ao som de música, girândolas de foguetes e aplausos e, no final, todos os presentes assinaram o auto da bênção e da inauguração, incluindo os banheiros, o maquinista, a revisora, a empregada de copa, o representante da Filarmónica da Ermegeira e todos os cavalheiros convidados pelo proprietário.
Tanto o documento do Auto de bênção e da inauguração como o projeto do estabelecimento balnear dos Cucos estão disponíveis no catálogo digital do Arquivo Municipal, que poderá ser consultado online. Para quem tenha curiosidade em aprofundar o conhecimento sobre as Termas e o seu impacto no concelho estão também disponíveis para consulta presencial o Receituário do Hospital Municipal dos Cucos (1918); quatro livros de atas da Comissão de Iniciativa das Termas dos Cucos e Praia de Santa Cruz (1922-1937); o projeto de delimitação da área reservada das nascentes de águas minerais denominadas Cucos (1929-1956); e o anteprojeto para obras de beneficiação no Estabelecimento Hoteleiro das Termas dos Cucos, por parte de José António Vieira (1957-1958).
Fundo: Termas dos Cucos
Título: Auto da bênção e da inauguração do estabelecimento balnear dos Cucos
Data: 15 de maio de 1893
Dimensão e Suporte: 1 capilha; papel
Paula Correia da Silva